segunda-feira, 12 de outubro de 2015

UM BALANÇO NECESSÁRIO DA GREVE NA UFMS

UM BALANÇO NECESSÁRIO DA GREVE NA UFMS. Vitor Wagner Neto de Oliveira (Professor de História do CPTL/UFMS e presidente da ADleste Seção Sindical do ANDES-SN) No dia 28 de maio deflagrou-se a greve docente nas Instituições Federais de Ensino (IFE). No dia 17 de junho iniciamos a greve na UFMS, Campus de Três Lagoas. Foram mais de 130 dias de greve nacional e mais de 110 de greve local. Até chegarmos à deflagração da greve na UFMS realizamos 11 assembleias (entre 2014 e 2015), reuniões nos gabinetes dos professores, conversa com estudantes nas salas de aula, manifestos divulgados na universidade e nas redes sociais, e diálogo com a comunidade externa por meio de panfletagem e da imprensa. A greve foi construída democraticamente e aceita pela maioria dos docentes presentes na assembleia de deflagração, como única ferramenta, legítima, para cobrar respostas efetivas do governo à pauta de reivindicações. A deflagração da greve nas IFE consistiu em uma resposta política à indignação que tomou conta da categoria, depois de várias tentativas infrutíferas de negociação com o governo, desde 2013. Até a deflagração, a última negociação de fato ocorrera em 23 de abril de 2014, na qual foi assinado um acordo entre a Secretaria de Educação Superior (SESu)/ Ministério da Educação (MEC) e ANDES-Sindicato Nacional, em que o governo reconheceu a desestruturação da carreira dos docentes federais e apontou para a continuidade da sua discussão conceitual. Desde então e até o início da greve o governo só enrolou. Por isso a categoria viu na greve o único meio de se fazer ouvir. Às pautas gerais em defesa da universidade pública gratuita e de qualidade socialmente referenciada, garantia de autonomia das IFE, reestruturação da carreira e valorização salarial de ativos e aposentados, acrescentou-se a luta contra os cortes no orçamento da educação pública. Na unidade com outras categorias (como os técnico-administrativos que já estavam em greve desde o início de maio, e os estudantes que também deflagraram greve em junho, acompanhando uma tendência igualmente nacional) as pautas nacional e local ganharam densidade e a luta se intensificou. A unidade nacional com diversas outras categorias dos SPF, incluindo trabalhadores docentes e técnicos dos Institutos Federais (IF), garantiu a persistência da greve mesmo contra as adversidades em mais de quatro meses. O governo tentou dividir o movimento, mas não obteve sucesso. Procurou negociar separadamente com as categorias e sindicatos, e buscou isolar o ANDES-SN, mas a unidade do Fórum dos SPF deu a resposta classista e se negou a rifar companheiros. Outra tática adotada pelo governo foi a de tentar desmobilizar propondo a negociação apenas salarial. O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) ficou cerca de três meses com a mesma contraproposta de reajuste salarial em quatro anos, buscando convencer os SPF a recuar e desistir das demais pautas. Diante da fortaleza da unidade o governo foi obrigado a recuar (pouco), e propôs o acordo salarial para dois anos, com os mesmos índices, além de revisão em benefícios que incidem sobre o salário líquido. Foi o único sinal de flexibilização por parte do governo em todo o período da greve. Todavia, caracteriza-se mais como um confisco salarial do que reajuste. A categoria em greve, por maioria na base, recusou a assinatura de tal acordo, o que demonstra a disponibilidade de continuar a luta para além da greve. A dureza no trato com o funcionalismo revela o caráter de classe deste governo e o projeto que o mesmo tem para a Educação Pública. Paralelo à diminuição drástica do orçamento, o que acelera o sucateamento das IFE, o governo silencia ou apoia deliberadamente os projetos que alteram o caráter público e gratuito das Universidades, como o que autoriza a cobrança de mensalidades na extensão e na pós-graduação (PEC 395/2014), o que aprofunda a mercantilização da ciência (PL 77/2015), e a possibilidade de contratação terceirizada de funcionários (inclusive docentes) via organizações sociais. O silêncio, o apoio ou o protagonismo da base parlamentar do governo a essas iniciativas privatizantes, revela que quando o assunto é o ataque aos direitos sociais, não há divisão entre governo e oposição de direita. Não se trata, portanto, de uma conjuntura isolada, mas de um projeto de desmonte do caráter público e gratuito da educação federal: uma perspectiva privatizante. Daí se explica a continuidade do investimento público nas instituições privadas via FIES. A Universidade e a luta pela defesa da educação pública, se inserem, portanto, em um contexto muito mais amplo de intensificação dos ataques aos direitos arduamente conquistados pelo povo brasileiro em 30 anos de democratização, como a Saúde, o direito à moradia urbana, o direito constitucional dos indígenas e quilombolas às suas terras, e a reforma agrária suspensa. Um ataque também frontal aos direitos trabalhistas, da mesma forma historicamente conquistados. Enquanto deu manteve-se a aparência de um governo popular que investia em assistencialismo, ampliava desorganizadamente as vagas em escolas técnicas e universidades, gerava algum emprego a partir da injeção de gordas quantias de dinheiro público em projetos industriais privados e em obras para mega eventos esportivos. Quando a crise do capitalismo se abateu com mais força, o véu que ainda cobria a face do governo caiu de vez: só não vê quem não quer ou quem ganha com isso. A face foi revelada pela opção que se fez diante do agravamento da crise: corta-se salário, demite-se, “enxuga a máquina” naquilo que mais atinge aos trabalhadores, mas mantêm-se o pagamento da dívida pública que concentra riquezas, o ganho dos banqueiros e grandes empresários, continuam os empréstimos subsidiados do BNDES e dos bancos oficiais. Esta política, por conseguinte, encontra um canteiro fértil no parlamento que aprova as medidas de austeridade e nos governos estaduais e municipais que a implementa. A oposição de direita tenta se dar bem com a crise política, mas se une ao governo quanto ao remédio amargo para a crise econômica: “austeridade fiscal” sobre os trabalhadores. A correlação de forças não nos favorece para continuar a greve, mas não é tamanha que tire o brio da luta. Continuaremos (devemos continuar) lutando, para manter o que ainda resta da Universidade Pública. Esta luta continua sendo nacional, ancorada nas consignas do ANDES-Sindicato Nacional que melhor representa, historicamente, a defesa da Universidade Pública, Gratuita, de Qualidade Socialmente Referenciada. Temos desafios talvez ainda maiores do que a construção de quatro meses de greve. O desafio de manter a unidade entre os lutadores, para continuar organizando a resistência em outras esferas. Afinal, o sindicalismo (e novamente o ANDES-SN é referência) não se faz somente na greve, ele está no cotidiano do trabalhador e nos debates fundantes e conjunturais da sociedade. Localmente, a unidade construída entre professores e estudantes deve ser preservada e aprofundada para que disso resulte em multiplicação de Centros Acadêmicos combativos e no fortalecimento da ADLeste como representante dos docentes. A unidade construída desde antes da greve entre ADLeste e ADUFMS, e intensificada neste contexto, também deve ter continuidade, com diálogo constante. A dureza da luta nos mostrou que é necessário estar organicamente em um movimento nacional, daí nosso chamado à ADUFMS de que esta é a hora de retornar ao ANDES-SN. Após a deflagração da greve no Campus de Três Lagoas mantivemos a convocação permanente da assembleia unificada (ADLeste/ADUFMS e Estudantes) realizando 18 consecutivas, além de diversas atividades em ruas e praças, caravanas à Brasília, São Paulo e Campo Grande. Podemos e devemos continuar a fazer o enfrentamento necessário ao autoritarismo da administração da UFMS e aos desmandos da Instituição, pois internamente também não conseguimos avançar na solução de problemas locais gerados ou agravados pela administração, como disposto em pauta protocolada na Reitoria: Defesa do padrão de qualidade, Defesa da gestão democrática, Condições dignas de trabalho, Garantia da permanência de alunos e combate a evasão. Não concebemos que a administração da universidade seja apenas “gestora” de uma política nefasta do MEC. Devemos retomar espaços de deliberações democráticas, que dêem o devido enfrentamento aos ditames governamentais. Nossa unidade é o que permitirá essa construção. Continuaremos a lutar para que não sejamos engolidos pela lógica produtivista que precariza nosso trabalho e nos individualiza. À mercantilização que tentam nos impor, responderemos com a dedicação ao trabalho de ensino, pesquisa e extensão com os nossos alunos, na busca de uma universidade e uma sociedade menos desigual. Saímos fortalecidos apesar de não termos nossas pautas atendidas! ADLeste – Três Lagoas-MS, 12 de outubro de 2015

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